08/12/2011

Piso dos Professores

Projeto de lei propõe alteração no reajuste do piso dos professores e gera controvérsias; alterações feitas no Senado retomam proposta semelhante à regra atual
 

A aprovação do piso dos professores já completou três anos, mas sua implantação continua cercada de dúvidas. A lei, aprovada por unanimidade no Congresso Nacional, determinou que nenhum professor de Educação Básica da rede pública com formação em nível médio poderia ganhar menos do que R$ 950 por uma jornada semanal de 40 horas. O valor correspondia àquele ano, 2008, e uma das polêmicas que cercam a lei está justamente no critério para reajustar o pagamento. Um projeto de lei para alterar a fórmula do cálculo está em tramitação na Câmara dos Deputados, mas ainda é incerto se haverá mudanças.

Pelas regras atuais, o salário dos professores deve ser reajustado todos os anos tendo como parâmetro o crescimento, em percentual, do investimento mínimo anual por aluno definido pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Entre 2010 e 2011, por exemplo, esse valor cresceu 15,5% e o mesmo percentual foi aplicado ao piso, que passou de R$ 1.024 para R$ 1.187. As estimativas do Ministério da Educação (MEC) indicam que em 2012 o valor desse reajuste deve ser superior a 20%.

Porém, logo que a lei foi sancionada, em 2008, o governo pediu a revisão desse critério e enviou um novo projeto de lei ao Congresso Nacional para que o reajuste tivesse como referencial o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a variação da inflação e é utilizado como critério de reajuste salarial para várias categorias.

A justificativa, presente no projeto de lei à época, era que caso o crescimento do Fundeb fosse utilizado como parâmetro para o cálculo, os custos com os salários a médio e longo prazo poderiam comprometer outros itens do orçamento da educação.

Incertezas

Na Câmara, a proposta foi aprovada sem alterações. Mas no Senado, por pressão dos sindicatos e entidades que representam a categoria, o texto foi novamente modificado. Volta-se praticamente ao formato original: o INPC só será levado em conta se o crescimento do valor por aluno do Fundeb for inferior à inflação do período. Com isso os trabalhadores evitam perdas quando houver oscilações nos recursos do Fundo, que depende principalmente da arrecadação de impostos.

"Não haverá perda salarial de um ano para o outro. A lei do piso inicia um processo de valorização do salário dos profissionais da educação", afirma o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão.

A alteração do projeto teve apoio da base do governo do Senado e também da União Nacional dos Dirigentes Municipais em Educação (Undime). "Em 2009, por exemplo, nós tivemos uma crise. Em alguns estados a arrecadação caiu e houve diminuição no repasse do Fundeb, mas o que não podemos é ter redução salarial", avalia Cleuza Repulho, presidente da entidade. Segundo o MEC, o governo voltou atrás na fórmula do cálculo do reajuste do piso após estabelecer uma mesa de acordo nacional incluindo a Undime, CNTE e o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).

"A meta do piso nacional é valorizar a profissão docente. As políticas de valorização não se restringem ao dispêndio com folhas de salários e proventos. Mas no caso do magistério público, a elevação dos salários é um componente incontestável para esse reconhecimento, dados os baixos patamares comparados a outras profissões com a mesma escolaridade", explica o secretário de Articulação com os Sistemas de Ensino do MEC, Carlos Augusto Abicalil.

Já as prefeituras, que alegam dificuldades para pagar o valor atual, defendem que a proposta original do reajuste pelo INPC era a mais adequada do ponto de vista das finanças municipais. "No primeiro ano o reajuste foi de quase 10%, no segundo ano de 15% e a previsão de 2012 é de quase 20%. Em três anos podemos ter um aumento de quase 50%, mesmo com a crise de 2009. Essa fórmula inviabiliza nossas contas", calcula o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski.

Outra mudança incluída na proposta do Senado é que o reajuste passaria a ser feito no mês de maio em vez de janeiro, como ocorre hoje. Isso beneficia os municípios já que no início do ano o valor por aluno é calculado por uma estimativa da arrecadação que pode ou não se consolidar.

Tramitação

Como foi alterado no Senado, o texto substitutivo retorna à Câmara para ser apreciado por três comissões. Já recebeu parecer favorável de duas delas e agora falta ser analisado pela Comissão de Finanças e Tributação, onde está parado desde o fim do ano passado. Ziulkoski defende o retorno ao texto original, com o reajuste baseado no INPC, mas não acredita que essa alternativa prospere no Congresso. "A pressão dos professores é forte e os parlamentares não estão preocupados com os custos", critica.

Já a CNTE atua para que o substitutivo do Senado seja aprovado. "Tivemos uma audiência com a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, que na época era senadora e nos ajudou a construir essa nova proposta. Estamos preocupados com a Comissão de Finanças, que está segurando esse projeto, e já sabemos extraoficialmente que há um parecer não muito favorável", conta Leão.

O MEC acredita que, se houver mobilização, o projeto de lei pode ser aprovado ainda em 2011. "Isso ajudaria muito a resolver dúvidas sobre a atualização do piso", acredita Abicalil.

Dúvidas comuns
Não é apenas a questão do reajuste do piso que desperta dúvidas nos dirigentes. A legalidade do dispositivo foi questionada ainda em 2008 por cinco governadores que entraram com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento, que foi concluído este ano, manteve a constitucionalidade da lei, mas mesmo com a publicação recente da decisão, restam questionamentos e ainda não há resposta para todos eles.

A reserva de um terço da carga horária para atividades fora da sala de aula é obrigatória? A regra já está em vigor?

Pela lei a regra é obrigatória, mas o dispositivo foi questionado na ação enviada ao STF e a Corte não conseguiu chegar a um acordo sobre sua validade. Houve empate de votos entre os ministros a respeito da constitucionalidade desse ponto específico e a dúvida permanece. A Undime defende que haja um período de transição de pelo menos três anos para que a regra seja aplicada e negocia esse prazo com o MEC e a CNTE.

Quem são os profissionais do magistério? Diretores e coordenadores também entram na lei do piso?

Sim. A lei estabelece que por "profissionais do magistério público da Educação Básica" entendem-se aqueles que desempenham as atividades de docência ou suporte pedagógico a ela, o que inclui coordenadores, orientadores e diretores.

O piso deve ser aplicado de forma proporcional nos casos de outras jornadas de trabalho, com diferentes cargas horárias?

A lei determina que nesses casos os vencimentos devem ser, no mínimo, proporcionais ao valor do piso. A Undime defende que seja aplicada a proporção - professores com jornada de 20 horas receberiam metade do piso. Mas a CNTE recomenda que os sindicatos entrem com ações nos judiciários locais, de forma isolada, para pedir esclarecimentos sobre a questão.

Onde denunciar o descumprimento do piso? O que pode acontecer com as redes que não cumprirem essa lei?

A CNTE incentiva os sindicatos estaduais a entrarem com ações na Justiça, de forma isolada, caso o piso não esteja sendo cumprido. Mas a lei não prevê nenhuma punição específica ao gestor que não cumpri-la. A Undime acredita que essa decisão dependerá de cada juiz.

O pagamento dos profissionais deve vir do Fundeb ou do mínimo de 25% da arrecadação que deve ser investido por cada ente federado?

A fonte do pagamento fica a critério de cada rede administrar. Em geral, as Secretarias de Educação usam a maior parte de seus recursos do Fundeb com a folha de pagamento.

Qual é a diferença entre piso e teto?

Durante o julgamento da lei, o STF deixou claro que o piso deve ser interpretado como vencimento inicial e não remuneração mínima. Ou seja: é o valor mínimo pago a um professor de nível médio para uma jornada de 40 horas; gratificações e outros benefícios não podem ser incorporados na conta do piso.

Qual diferenciação deve ser aplicada entre os salários dos professores com nível médio daqueles com nível superior?

A lei determina o valor mínimo que deve ser pago aos profissionais de nível médio, mas não estipula como esse piso deve ser aplicado aos professores com nível superior. Isso deve ser determinado por cada rede de ensino em seus planos de carreira. A CNTE, porém, recomenda que a diferença seja de, no mínimo, 50%.
 
 
CIEGLINSKI, Amanda. Piso dos professores. Revista Escola Pública. Disponível em: http://revistaescolapublica.uol.com.br/materia.asp?edicao=23&id_materia=213. Acesso em: 08/12/2011.

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